terça-feira, 31 de março de 2009

O que o travesseiro me conta

(hand on the pillow by tju-tjuu - deviantart)



Quisera eu ter as cores certas para pintar a vida na aquarela que ela merece ter. Quisera ter noção do equilíbrio necessário e saber que a corda não é bamba. Mais bamba do que ela é quem nela se equilibra desde a primeira inspiração. Quisera poder expiar os pecados que assaltam à noite. Quisera poder entender o enigma, o sentido, a mentira, a verdade, a bula do remédio e tudo o mais que rouba o sono dos justos. Quisera ter um propósito, conhecer o encaixe, saber-se vivo, afugentar a morte e ser. Ou não ser? O acordo é simples e nele incluo o meu reino. Há algo de podre, o fantasma contou-me segredos em entrelinhas e o furto de palavras dá-me desejo de tomar veneno. Eu sei, é muito barulho por nada. Mas, quanto ao acordo, digo que me bastam algumas respostas, algumas cores e um cigarro ao entardecer. Pintaria a vida em tons amenos e com o pincel desenharia uma placa indicando o caminho a seguir. Quisera saber, de antemão, se mesmo tendo o mapa, a bússola e o compasso, se mesmo tendo lido o azimute com correição, se mesmo que a estrada fosse de ouro e comigo estivessem o espantalho, o homem de lata e o leão, eu não me desviaria para direita ou para a esquerda. Quisera poder respirar bons ares e me deixar seduzir por um sono tranquilo. Mas, por fim, amanhece o dia, e lá se foi mais uma noite em branco.

6 comentários:

Karol Maia disse...

Muito bom o texto João... muitas coisas também penso em noites que estou só.
Espero ver mais poemas agora em Abril... Abraço para todos.

Zélia disse...

Bom texto o teu, João. Mas eu devo dizer, amigo, que embora o querer seja parte da naturaza inquieta de todo ser humano, às vezes, é bem melhor não querer. Ou não querer tanto. O querer "esquenta" a cabeça da gente. Houve um tempo em que quis muito mais (mesmo sendo pouco). Hoje, quero menos ainda. Isso me deixou mais leve, o coração mais solto. O meu mundo ainda não tem a aquarela que eu queria que ele tivesse mas eu vou soltando umas pinceladas aqui e ali e tudo vai ficando mais a minha cara. Sei que com vc é assim também e já soube que vc anda fumando outra vez... :(

João Neto disse...

Pois é Zélia... más notícias correm rápido. Vamos torcer para que seja só um momento breve.

Alessandro Medeiros disse...

John... esse tipo de situação tem acontecido muito comigo, não sei se é o teu caso... mas, tenho aprendido muito com essas noites em branco, principalmente com o silêncio... espero que possas também tirar um bom aproveito disso, que nos deixa um pouco cansado, com stress, entediado... no outro dia!!! Mas tente tirar sempre o lado bom das coisas... Abração.

Letícia disse...

Poetas e seus fantasmas. Você é poeta, João e, por isso, carrega fantasmas. É um karma. E gostei muito do Quisera... e da corda bamba.

Bjs.

Marília Silveira disse...

As noites de escrita não passam em branco, caro amigo! Elas são feitas de cor negra, "olor" a café (ainda que eu só beba os virtuais e que aqui no sul tenha "olor" a erva mate...) e cigarros.

O detalhe é que às vezes elas vem sem aviso e lutamos contra (tentamos dormir!) quando tudo o que ela quer é que nos deixemos seduzir por aquilo que só há na noite, por aquele silêncio arrebatador que só uma boa madrugada oferece.

Ainda assim eu também quisera... quisera não ter que voltar de viagem... mas tive que voltar...

e quanto aos cigarros, sem apelos, fume-os apenas, evitando a culpa, é ela que envenena.

com um abraço carinhoso!